terça-feira, 6 de janeiro de 2009

O ano passado

O ano passado


O ano passado não passou,
continua incessantemente.
Em vão marco novos encontros.
Todos encontros passados.


As ruas, sempre do ano passado,
e as pessoas, também as mesmas,
com iguais gestos e falas.
O céu tem exatamente
sabidos tons de amanhecer,
de sol pleno, de descambar
como no repetidíssimo ano passado.


Embora sepultos, os mortos do ano passado
sepultam-se todos os dias.
Escuto os medos, conto as libélulas,
mastigo o pão do ano passado.


E será sempre assim daqui por diante.
Não consigo evacuar
o ano passado.


Carlos Drummond de Andrade, Corpo.




Sempre Drummond! Desde criança que tento exprimir esta mesma sensação e de repente este poema.
É claro que todos aqueles votos, desejos, promessas, esperanças nos ajudam a ser mais sociáveis, mas aí chega janeiro e nada, como se esperássemos que, por milagre, "a partir de janeiro as coisas mudem", como já bem disse este mesmo poeta em Receita de ano novo.
E por que este desejo imenso de que o ano novo seja diferente? Não quero enterrar e esquecer 2008, nem 2007, nem 2006...
É preciso fazer melhor? Não há dúvidas. Mas isto não é o ano novo que vai fazer. É cada um em seus pequenos atos. Porque "é dentro de você que o Ano Novo cochila e espera desde sempre".

Feliz 2009!

Nenhum comentário:

Postar um comentário